Primavera
Saímos de casa. Enlaçados pelos dez dedos das nossas duas mãos que se uniam, mais uma vez, naquele sábado de manhã solarenga, fizemo-nos às ruas daquela cidade. Não da minha, muito menos da que o viu crescer, mas daquela que nos conquista devagarinho e nos prende, nos une de cada vez que nos reencontramos ali. O dia prometia-se cheio de luz e calor e as ruas, essas, apresentavam-se repletas de gente, numa fusão de vozes e sorrisos, de compras madrugadoras levadas em sacos, em carrinhos puxados ao ritmo das conversas. As lojas, já abertas, convidavam a que se entrasse e se percorresse com os olhos os inúmeros artigos em exposição. Mas a vontade ficava-se pelo exterior dos primeiros dias da Primavera que chegava. Sob o esvoaçar das gaivotas e o cantar dos pássaros lampeiros que salpicavam o céu de azul claro, os afectos, os abraços, os beijos demorados, os olhares saltitantes dos rostos aos jogos de cartas nas mesas do jardim por onde passavamos. A fonte ao centro e os bancos em redor escolhidos para descanso dos mais sábios. De passo sem pressa alguma, descíamos as ruas da cidade, sem nunca nos largarmos. E fazíamos das fachadas, das montras envidraçadas espelho da felicidade que nos brota dos poros por nos vermos enfim juntos, por dois dias que sejam. Estava um dia de sol primaveril. E as flores adormecidas no inverno que passara voltavam a abrir-se em milhares de cores, múltiplos feitios, fazendo-nos brilhar os olhos. Mais um sábado a norte, ao encontro do que de melhor a primavera traz. E aqueles dedos entrelaçados também.