Pausa
Sob o fogão, um púcaro onde, em lume baixo, a bebida de arroz aquece lentamente. Na caneca, coloco cuidadosamente uma porção de pimenta preta, outra de açafrão das índias ou, se assim lhe quisermos chamar, curcuma. Cai, manchando a porcelana de tonalidades amarelas. Lembro-me de Marrocos e as suas cores quentes, vibrantes e os seus cheiros densos e intensos. Corto um pedacinho de gengibre. Pouco mais do equivalente ao meu dedo mindinho, digamos assim. E descasco-o, passando o por água. Por entre os diversos utensílios de cozinha - tesoura, descascador de cenouras, passador, um ralador. O ralador. Com cautela para que não rale mais do que o gengibre, deslizo, atenta, o pedacinho que se desfaz, juntando-se ao pó da cor do sol, às partículas pequeninas, negras, da pimenta. Dirijo-me à bancada atrás de mim, à primeira gaveta que os meus olhos encontram e, com a mão direita, retiro uma coler, as de chá. Na outra, um frasco de vidro que me permite ver que pouco ficará para quem depois de mim precise de adoçar a boca. Uma colher de mel, generosa. E sob o lume brando, a bebida vegetal já acusa início de fervura. Retiro-a, com a ajuda de uma pega para que não me queime e verto-a, fumegante. Com a outra mão misturo os sabores que se agitam. Na prateleira um pouco acima da linha dos meus olhos, frasquinhos de especiarias. Com um gesto, sirvo-me de canela em pó, quanto baste. E a cozinha enche-se de aromas. Apago a luz atrás de mim e dou o primeiro gole, dirigindo-me para o corredor.
Tenho uma história para continuar e as palavras não esperam.